Iniciativa é uma das ações do projeto Opaná: Chão Indígena, parceria entre a Itaipu Binacional e a Fundação Luterana de Diaconia (FLD),
A ampliação dos quintais produtivos e roçados nas comunidades Avá Guarani, por meio do projeto Opaná: Chão Indígena, tem contribuído para aumentar a oferta de alimentos e diversificar a nutrição das famílias indígenas do Paraná. Com apoio técnico e a adoção de práticas agroecológicas, muitos tekohas (aldeias) estão fortalecendo seus espaços de plantio, mesmo diante de limitações como o clima do oeste paranaense e a insegurança territorial que muitas comunidades enfrentam.
O projeto Opaná: Chão Indígena é uma parceria entre a Itaipu Binacional e a Fundação Luterana de Diaconia (FLD), com objetivo de garantir a sustentabilidade ambiental e alimentar das comunidades indígenas do Oeste e Litoral do Paraná. Entre as práticas que vêm sendo incentivadas dentro do projeto está o consórcio entre culturas.
No Tekoha Hite, Vermiceu Cardoso plantou milho junto com abóbora e está obtendo bons resultados. A abóbora ajuda a manter a umidade no solo e controlar o crescimento de plantas espontâneas, favorecendo, assim, o desenvolvimento do milho. Esse tipo de manejo promove maior equilíbrio entre as espécies cultivadas e melhora o aproveitamento do espaço e dos recursos naturais.
O consórcio de diferentes plantas não é algo novo, trata-se de uma prática milenar muito utilizada pelos povos originários. Um exemplo é a chamada milpa, sistema tradicional de cultivo dos povos mesoamericanos baseado na associação entre milho, feijão e abóbora. Mais do que uma simples técnica agrícola, a milpa é um sistema regenerativo, que promove a conservação do solo e favorece a biodiversidade. O milho fornece a estrutura para o feijão crescer, o feijão enriquece o solo com nitrogênio, e a abóbora cobre e protege a terra.

Esse é apenas um exemplo, dentre muitos possíveis, de associações benéficas entre diferentes cultivos. Cabe ressaltar que, muito antes do conceito de agroecologia existir, os povos originários sempre aplicaram, em seu cotidiano, princípios agrícolas sustentáveis e regenerativos aos ecossistemas.
Outro ponto central para os avanços observados nas hortas e roçados das comunidades do oeste paranaense é a proteção do solo. O assessor de projetos da FLD, Erison de Jesus Moreira, que atua junto às comunidades guarani de Santa Helena e Itaipulândia, destaca a importância da cobertura do solo como estratégia para conservar umidade, proteger contra a erosão e manter a fertilidade. “Devido à perda dos territórios, muitos conhecimentos tradicionais foram sendo esquecidos ao longo do tempo, como a cobertura do solo — uma técnica antiga que agora vem sendo retomada pelas comunidades, com o uso de palhadas e folhas”, afirma. O sucesso da técnica é tão evidente que já vem se espalhando por diversos territórios.
Essa visão está alinhada aos princípios defendidos por Ana Primavesi, importante referência da agroecologia no Brasil. Primavesi sempre defendeu que o solo deve ser tratado como um organismo vivo. Em seus estudos, ela demonstrou como a presença de matéria orgânica, o estímulo à vida microbiana e o respeito aos ciclos naturais eram fatores essenciais para manter a saúde da terra e a produtividade agrícola. “O segredo da vida é o solo, porque do solo dependem as plantas, a água, o clima e a nossa vida. Tudo está interligado”, escreveu. Esse enfoque tem sido incorporado ao trabalho do projeto Opaná, em diálogo com os conhecimentos tradicionais das comunidades.

Outro recurso agroecológico que vem sendo adotado é o uso de biofertilizantes e caldas naturais para o manejo sustentável dos cultivos. Produzidas a partir de ingredientes acessíveis, como esterco, cinzas, plantas medicinais e outros insumos disponíveis no próprio território, essas soluções são ricas em nutrientes e microrganismos benéficos. Além de fortalecerem o solo e as plantas, promovem o controle ecológico de insetos e doenças. “Várias plantas, facilmente encontradas nos territórios indígenas, possuem propriedades benéficas para os cultivos, por exemplo, a calda de mamona, que pode ser usada para controle de formiga, pulgão, cochonilha. O alho, que pode ser usado para fungos de diversos tipos, dentre muitos outros exemplos”, complementa Erison.
No Tekoha Pohã Renda, Agustina Vera Benites tem cuidado da horta com dedicação. Com apoio do projeto, a área plantada aumentou significativamente e hoje ela colhe verduras e legumes para o consumo diário da família. Ela comenta que antes já fazia horta com seu pai, porém agora tem a oportunidade de cuidar de seu próprio espaço. “A gente tem mais comida e mais variedade na alimentação”, relata. Juntamente com sua filha, Alana, elas se dedicam nos cuidados com a horta e também com as árvores nativas plantadas há alguns meses pelo projeto.
O fortalecimento desses espaços de cultivo nos tekohas é muito importante diante da situação de vulnerabilidade enfrentada pelo povo Guarani no oeste do Paraná. Muitas comunidades, além de enfrentarem a insegurança alimentar, estão cercadas por monoculturas que utilizam intensivamente agrotóxicos, expondo diretamente a saúde das famílias e os ecossistemas locais à contaminação, como foi denunciado no relatório publicado pela Comissão Guarani Yvyrupa em 2023.
Agora, no mês de junho, várias comunidades já se preparam para o plantio das ramas de mandioca, um cultivo muito importante dentro da cultura Guarani. Para esse povo, cultivar vai além da produção de alimentos: é também uma prática ligada à resistência, à espiritualidade e à continuidade da luta pelo território.
(*) Material produzido por Assessoria FLD