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Há meio século, era assinada a Ata do Iguaçu, a "semente de Itaipu"
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22/06/2016
Um dos mais importantes documentos históricos das relações entre Brasil e Paraguai, fundamental para o surgimento da Itaipu Binacional, completa meio século nesta quarta-feira (22). No dia 22 de junho de 1966 era assinada, em Foz do Iguaçu, a Ata do Iguaçu – registro seminal para o Tratado de Itaipu e a construção daquela que, anos mais tarde, viria a ser a maior usina hidrelétrica do planeta. Clique aqui e veja a Ata do Iguaçu na íntegra.
 
Assinada pelos ministros das Relações Exteriores do Brasil, Juracy Magalhães, e do Paraguai, Sapena Pastor, a Ata do Iguaçu, também chamada de Ata das Cataratas, foi o primeiro documento bilateral manifestando a intenção de aproveitar os recursos hidráulicos do Rio Paraná. A ata ainda antecipou temas que mais tarde seriam esmiuçados no Tratado de Itaipu, de 1973, como a divisão da energia entre os dois países.
 
As tratativas entre os ministros começaram no dia em 21 de junho, em Porto Presidente Stroessner (hoje Ciudad del Este), e terminaram no dia 22, em Foz, onde a ata foi firmada.
 
Para o diretor-geral brasileiro, Jorge Samek, a Ata do Iguaçu simboliza não apenas um marco para a história da usina, mas também uma referência para a integração e resolução de conflitos que, mais tarde, inspiraria a criação de diversas organizações intergovernamentais. “O Mercosul é um exemplo”, ressalta.
 
Como toda ação vanguardista, a assinatura da ata exigiu desprendimento e perseverança, o que precisa ser reconhecido, segundo o DGB. “Presto minha homenagem aos brasileiros e paraguaios que, há 50 anos, tiveram a inteligência, coragem e determinação para negociar, resolver divergências seculares e levar adiante um projeto que, hoje, é crucial para o desenvolvimento dos dois países, sob vários aspectos”, diz.
 
“Saúdo também todos que fizeram e ainda fazem parte dessa história, desde o início, dos diplomatas que assinaram a ata aos empregados que estão na Itaipu, passando pelos barrageiros e todos os que trabalham nesta empresa tão importante”, conclui Samek.
 
Guimarães Rosa
 
Um dos capítulos mais interessantes do processo que culminou na assinatura da Ata do Iguaçu foi o trabalho de bastidor liderado pelo diplomata, médico e consagrado escritor brasileiro João Guimarães Rosa, na época chefe da Divisão de Fronteiras do Ministério das Relações Exteriores.
 
O autor de Grande Sertão: Veredas, um dos maiores clássicos da literatura brasileira, teria sido o primeiro a sugerir oficialmente a sociedade dos dois países para, ao mesmo tempo, superar uma arrastada disputa fronteiriça e aproveitar o grande potencial energético da região, que já era de conhecimento do Brasil e do Paraguai.
 
Diplomata traquejado e respeitado, Guimarães Rosa conhecia como poucos as questões de limites do Brasil e seus vizinhos. Dosando ceticismo e esperança de consenso, participou ativamente das discussões que levariam aos primeiros acordos sobre a construção de Itaipu. Há quem sugira, inclusive, que teria sido ele o redator dos termos da Ata do Iguaçu.
 
Morreu em 1967 e não chegou a ver o realizado o empreendimento anunciado pela ata, que só começou a se concretizar da década seguinte.
 
Ata “limpou o terreno”
 
Com 30 anos de casa e afeito aos documentos basilares da binacional, o advogado João Emilio Correa da Silva de Mendonça, assistente da Diretoria Jurídica (AS.JD), fez uma breve análise histórica da Ata do Iguaçu, a pedido do JIE.
 
De acordo com Mendonça, a ata foi um passo preparatório indispensável para a posterior celebração do Tratado de Itaipu. “Ela permitiu que os países alinhassem seus entendimentos com relação ao uso e atividades no Rio Paraná, dando segurança jurídica para que as partes partissem para as negociações do Tratado de Itaipu.”
 
Primeiro documento bilateral relativo ao tema, a ata representa, na opinião do jurista, muito mais que uma mera formalização de um encontro diplomático. “Foi a manifestação de compromissos, das posições coincidentes dos dois países, que serviu como norte para o Tratado de Itaipu, notadamente para o princípio da igualdade de direitos e deveres e do conceito de condomínio.”
 
Para Mendonça, a Ata do Iguaçu é um marco histórico não apenas para as relações entre os dois países, mas também uma referência internacional sobre o aproveitamento de rios comuns a um ou mais Estados. E foi além. “A Ata do Iguaçu ‘limpou o terreno’ para que a Itaipu viesse a existir”, ressalta.
 
Na avaliação de Mendonça, “a Ata do Iguaçu é exemplo marcante de brilhante estratégia de cooperação internacional, de prevenção de contenciosos internacionais e mostra como a diplomacia é importante e pode produzir resultados importantíssimos para os Países, não só em questões políticas, mas também econômicas, sociais e ambientais”.
 
Do desacordo à ata
 
A assinatura da ata foi precedida por uma longa contenda fronteiriça, iniciada mais de dois séculos antes. Em 1750, Portugal e Espanha assinaram o Tratado da Permuta, definindo os contornos fronteiriços das então colônias, mas o texto era impreciso ao determinar a posse de terras na região do Salto de Sete Quedas.
 
Assinada um ano após a inauguração da Ponte Internacional da Amizade, a Ata do Iguaçu solucionou o impasse ao prever a inundação da região para a formação do reservatório. O que não ficou submerso foi transformado em área de proteção ambiental binacional. Os dois governos mostravam ao mundo que a melhor maneira de resolver a questão litigiosa era pela via diplomática, unindo forças e aproveitando o potencial hidrelétrico da região de forma conjunta.
 
Da ata à usina
 
O entendimento diplomático sacramentado pela ata abriu caminho para o início dos estudos técnicos. Em 1967, uma Comissão Mista foi criada para implementar os termos do acordo. O consórcio formado pelas empresas IECO e ELC venceu a concorrência internacional para a elaboração dos estudos de viabilidade e do projeto da obra.
 
Em 26 de abril de 1973, o auge do empenho diplomático e jurídico: Brasil e Paraguai assinaram o Tratado de Itaipu, instrumento legal para o aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná pelos dois países. No mesmo ano, técnicos percorreram o rio de barco em busca do ponto mais indicado para a construção da usina. Após estudos com o apoio de uma balsa, foi encontrado o local. Nele havia uma pequena ilha, que os índios da região chamavam de Itaipu – que em tupi-guarani quer dizer “a pedra que canta". O megaempreendimento tinha, então, um nome.
 
Para gerenciar a construção e operação da hidrelétrica, em 17 de maio de 1974 a Itaipu Binacional é formalmente constituída como empresa. O governo brasileiro foi o responsável pela obtenção de recursos para a construção da usina. No segundo semestre do mesmo ano chegavam as primeiras máquinas ao futuro canteiro.
 
Itaipu foi a única grande obra a atravessar a fase mais aguda da crise econômica brasileira do fim dos anos 1970, mantendo o status de prioridade absoluta.
 
As obras da barragem terminaram em outubro de 1982. O reservatório foi formado no mês seguinte. O primeiro giro mecânico de uma turbina aconteceu em 17 de dezembro de 1983. Itaipu começou a produzir energia em 5 de maio de 1984, quando entra em operação a primeira das 20 unidades geradoras do projeto. Dezoito unidades foram instaladas no espaço de sete anos. Em maio de 2007 entraram em operação as últimas duas das 20 unidades geradoras previstas no projeto.
 
A decisão de construir em conjunto a usina, manifestada preliminarmente na ata cinquentenária, teve profundos reflexos em ambos os países.
 
Até a manhã desta quarta-feira, Itaipu acumulava uma geração de 2.361.626.463 MWh, de longe a maior do planeta. Em maio, chegou à marca de 10 bilhões de dólares em royalties repassados aos dois governos. Além de continuar batendo sucessivos recordes de produção, as múltiplas ações socioambientais, de apoio às economias locais e de suporte à pesquisa e desenvolvimento completam o quadro que, após meio século, confirmam a acerto da decisão diplomática manifestada na Ata do Iguaçu.
 
A dívida para a construção de Itaipu terminará de ser paga em 2023.